sexta-feira, abril 23, 2010

POLUIÇÃO DO PULMÃO

A maioria das pessoas acreditam que a Floresta Amazônica é o pulmão do planeta. Que, se ela desaparecer, o aquecimento global vai se acelerar de modo calamitoso. Quanto a isso, vale uma ressalva. Para merecer o título de pulmão do planeta, a região precisaria parar de envenenar a atmosfera com gases do efeito estufa. Atualmente, as 260 usinas termelétricas em operação em sete estados amazônicos, a grande maioria movida a óleo diesel, despejam todo ano na atmosfera 06 (seis) milhões de toneladas de dióxido de carbono (CO2), o principal gás que causa o aquecimento global.
Parece pouco diante dos 770 milhões de toneladas de CO2 emitidas anualmente pelo desmatamento e pelas queimadas, na floresta. O CO2 produzido pelas termelétricas amazônicas, contudo, equivale ao dobro das emissões produzidas no mesmo período pela frota de veículos da cidade de São Paulo, a maior do país. Manaus abriga uma das mais bem sucedidas experiências de desenvolvimento sustentável, a Zona Franca, que produz riquezas sem precisar destruir um só graveto da floresta, Para movimentar suas indústrias, no entanto, a cidade depende quase integralmente da queima de óleo, As termelétricas respondem por 85% da eletricidade consumida no Amazonas, 70% no caso do Acre e 60% no do Amapá.
O pulmão do mundo encontra-se intoxicado pela fumaceira.
Numa região rica de recursos hídricos, não é nada de mais esperar que pelo menos 90% da energia elétrica consumida em suas cidades venha de fontes limpas, como as hidrelétricas. As termelétricas, além de poluidoras, não são confiáveis. Há grandes oscilações de energia ao longo do dia e às vezes falta luz. Isso representa um custo tremendo para as empresas, que instalam geradores próprios para se precaver das falhas de energia.
A poluição e o custo extra para as indústrias não são os únicos ônus da dependência da Amazônia das termelétricas. A região não produz uma só gota do óleo diesel queimado nas usinas. Ele vem de São Paulo, do Rio de Janeiro e até de outros países, como Índia, Estados Unidos e Venezuela. O resultado é uma energia até cinco vezes mais cara do que a utilizada no restante do país. Se fosse integralmente repassada ao consumidor final, essa diferença praticamente inviabilizaria a venda da energia das termelétricas. Por isso, existe um mecanismo para subsidiar o diesel usado na Amazônia, Conta de Consumo de Combustíveis (CCC), estimada neste ano em 2,7 bilhões de reais. Esse valor é rateado todos os consumidores do país. Entre 2% e 3% da conta de luz que o brasileiro paga, more ele em Porto Alegre, Salvador ou Vitória, destina-se a subsidiar a energia da Amazônia.
Levar o óleo diesel as termelétrica da Amazônia é uma operação, além de custosa, complicada. Todos os meses atracam em Manaus cinco petroleiros carregados com 180 milhões de litros de óleo para abastecer as usinas e o setor de transportes da região norte. Os petroleiros percorrem quase 6000 quilômetros, do Sudeste até Manaus. De lá, o diesel é levado para outras cidades da Região Norte a bordo de quase 200 balsas-tanque e 500 caminhões. Há trechos, como o que se percorre até Cruzeiro do Sul, no Acre, que exigem mais de 4 000 quilômetros de navegação pelos rios.
A viagem dura 25 dias, ou mais, além dos quinze gastos inicialmente no transporte a partir do Sudeste, dependendo das dificuldades criadas pela natureza. Nos períodos de seca, quando o nível dos rios fica muito baixo, o transporte por balsas é interrompido durante quatro meses e o combustível precisa ser estocado para não haver desabastecimento na cidade. Essas condições adversas resultam às vezes em situações esdrúxulas. Dependendo do destino do diesel, chega-se a gastar 2 litros dele como combustível para transportar cada litro que vai alimentar uma termelétrica.
Além de produzir poluição e atrapalhar a atividade econômica, a dependência de diesel causa vários transtornos à população da Amazônia. Nas comunidades ribeirinhas onde a única fonte de energia é um pequeno gerador, os moradores precisam racionar combustível para ter luz o mês inteiro. E, mesmo assim, apenas parcialmente, porque nesses casos o equipamento só é ligado três horas por dia, geralmente à noite.
Acabar com a dependência do diesel na Amazônia é uma prioridade que esbarra sistematicamente na oposição de ambientalistas e do IBAMA. Há hoje no Brasil dezoito projetos de hidrelétricas que não saem do papel ou cujas obras estão atrasadas por causa de ações judiciais que questionam seu impacto ambiental. Os motivos são variados: os rios que receberão as turbinas passam por reservas indígenas ou áreas de preservação. No Madeira, gastou-se em estudos sobre o impacto na piracema dos bagres (a conclusão foi que bastava deixar uma passagem para os peixes, como normalmente é feito em barragens).
A oposição do IBAMA e dos ambientalistas a obras energéticas necessárias ao desenvolvimento da Amazônia não interessa a ninguém, muito menos aos moradores da região. O Brasil precisa ampliar sua produção d energia em 50% até 2017. As usinas hidrelétricas constituem a forma mais limpa e barata de produzi-la. A tecnologia hoje permite que os reservatórios das hidrelétricas tenham apenas 15% do tamanho que tinham no passado. Ou seja, seu impacto ambiental é muito menor. Mesmo assim, no Brasil, por incrível que pareça, os ambientalistas têm mais fôlego para combater as hidrelétricas do que as carvoarias.
Como a Amazônia tem características geográficas complexas, com rios gigantescos e florestas densas, levar as linhas de transmissão de eletricidade a muitos pontos da região é difícil. Estudos mostram que, nessas áreas, o ideal seria recorrer às fontes alternativas de energia, Entre elas, a eólica tem potencial restrito.
Poderia ser explorada quase exclusivamente na costa do Amapá, com condições de vento semelhantes às do Nordeste. A opção que se mostra mais viável nesses casos é a energia solar. A Amazônia tem média de radiação solar três vezes superior à de países como a Alemanha, líder mundial em energia produzida por painéis fotovoltaicos. A implantação da energia solar em municípios de porte médio ou pequeno é uma operação relativamente rápida que poderia, em pouco tempo, reduzir o uso das usinas termelétricas em diversos pontos da Amazônia. Em comunidades ribeirinhas, as fontes alternativas de energia podem substituir por completo os geradores a diesel.
É preciso tirar do papel os projetos de grande porte, como as hidrelétricas, e apostar nas energias alternativas para livrar a Amazônia da fumaceira poluente e cara do óleo diesel.

Um comentário:

Eliana disse...

As dúvidas e incertezas que cercavam o leilão da Usina de Belo Monte, que será a terceira maior hidrolétrica do mundo. È indispensável que governo, empresas, entidades ambientalistas e organizações indígenas ajam com bom senso e espírito público, buscando num processo de negociação o que é melhor para o país.Belo Monte é, como as usinas do Rio Madeiram, marco importante na construção de um país energeticamente sustentável. País de imensas potencialidades hídricas, o Brasil não pode deixar de usar com amplitude e inteligência esse diferencial estratégico.Serve de alerta seu artigo. Parabéns .

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