sexta-feira, fevereiro 26, 2010

EFEITOS DA ATIVIDADE FÍSICA SOBRE A APTIDÃO MUSCULAR NA TERCEIRA IDADE

O foco de atenção das pesquisas relacionando aptidão física e saúde no idoso tem recaído sobre a atividade física de natureza predominantemente aeróbia, devido a sua associação com melhoras na condição da saúde biológica e na melhora de certas doenças crônicas diretamente relacionadas com o sistema cardiorrespiratório. Porém, em termos práticos, tal melhora relaciona-se muito mais com a redução dos fatores de risco das doenças cardiovasculares do que com a capacidade do individuo em permanecer funcionalmente independente. Ou seja, para um idoso realizar suas tarefas cotidianas como subir escadas, carregar suas compras e abaixar-se, ele necessita de pouca aptidão cardiovascular, mas mais de um conjunto de capacidades como força muscular, resistência muscular localizada e flexibilidade, conjunto este denominado “aptidão muscular” pelo American College of Sports Medicine (Blair et al. 1994).
Os efeitos funcionais resultantes das alterações musculares são a diminuição da força e o aumento na dificuldade de coordenação, que contribuem para uma diminuição da capacidade em realizar atividades diárias e elevam o risco de incapacitações físicas. É bem conhecido o fato de que, com o decorrer da idade, a elast icidade e estabilidade dos músculos torna-se menor pela atrofia muscular e a massa muscular diminui em proporção ao peso do corpo, o que leva a uma redução da força muscular . Além disso, observa-se um prejuízo na flexibilidade, ocasionado por degenerações e danos nas articulações.
Esses processos reduzem consideravelmente a mobilidade das pessoas idosas. A atrofia muscular aumenta o risco de incapacitações ortopédicas e diminui o controle sobre o corpo esse menor controle aumenta o risco de acidentes, sobretudo quedas. Somas-se a essas alterações a diminuição da flexibilidade, que prejudica a resolução de problemas simples do cotidiano como vestir-se, lavar-se, limpar a casa, entre outros (Meusel 1984).
Há a sugestão da existência de um “limiar” de força mínimo para a realização das AVDs e das AIDVs, que estaria relacionado com a quantidade de peso corporal que a pessoa pode sustentar na realização de tais atividades. Abaixo desse limiar, o individuo torna-se incapaz de manter sua independência e autonomia, ao passo que a melhora na força pode capacitá-lo a realizar suas tarefas cotidianas. Além disso, há estudos sobre quedas em idosos que associam redução da força de membros inferiores à incapacidade em levantar-se de uma cadeira, com instabilidade ou pouco controle postura, com redução da amplitude de passada e da velocidade do andar (Phillips e Haskell 1995).
Vários autores observam que o processo de envelhecimento do sistema muscular reduz tanto as forças estática e dinâmica máximas, quanto a potência e a velocidade máximas, mas afirmam que elas pode ser aumentadas para os idosos que se submetem a programas regulares de força. Buskirk e Segal (1989), revisando vários estudos sobre força em mulheres e homens de 60 a 65 anos, concluíram que homens e mulheres, na sexta década de vida, têm uma capacidade semelhante e podem ter um aumento de 30% a 40% na sua força. Aoyagi e Shephard de força, que dentre os aspectos observados podem ser citados hipertrofia muscular, prevenção da atrofia muscular e lentificação no decréscimo do número de fibras. Quanto aos ganhos em força, os autores verificaram que estes variam de 10% a 44%, dependendo do tempo do treinamento e de sua intensidade.
É duvidoso ainda se a melhora desse desempenho pode ser atribuída a ganhos de massa muscular ou a um melhor recrutamento neural, ou mesmo a uma melhoria na habilidade de execução dos movimentos em estudo. Esses autores sugerem ainda que o treinamento regular da força pode manter a velocidade de contratação pela preservação da combinação excitação-contração, mais do que pela diminuição de fibras tipo II. Essas respostas levam ao aumento tanto da força estática quanto da dinâmica. No entanto, não se observam mudanças no pico da velocidade da contração.
Puggaard et al. (1994) acompanharam a evolução dos efeitos de cinco meses de programas de ginástica, dança e natação sobre a força máxima, a coordenação, o equilíbrio, o tempo de reação e a flexibilidade de 59 homens e mulheres, com idade entre 60 e 82 anos. Observaram que, independentemente do tipo de atividade praticada, o treinamento sistemáticos teve um efeito fisiológico importante em todas as variáveis estudadas, indicando um aumento nas funções neuromusculares.
Para Fleck (1993), o treinamento sistemático da força pode desacelerar a perda da massa muscular e assim manter seus níveis. Ele observa que a atividade física moderada, para indivíduos de 30 a 70 anos, pode resultar num ganho de força de 10% a 20%. Acrescenta, também, que atletas que treinam sistematicamente a força mantêm valores altos de força e de potência muscular até a sexta década de vida. O autor também aponta estudos evidenciando aumento na força muscular na nona década de vida, numa proporção de 15% a 28% após 10 a 12 semanas de treino, sendo esta uma resposta ao treinamento semelhante à dos indivíduos mais jovens. Não há dúvida de que tais ganhos de força têm um impacto significativo sobre a qualidade de vida desses indivíduos.
O autor também ressalta a existência do mito de que o treinamento de força resulta em hipertensão. Embora a pressão sangüínea se eleve substancialmente durante o treinamento de força, em repouso ela não apresenta alterações. Segundo o autor, essa elevação da pressão arterial durante o treinamento decorre de problemas cardiovasculares já portados por alguns indivíduos, não tendo sido observado nenhum acidente de treinamento em programas de reabilitação cardíaca. Para o autor, apesar de serem poucos em indivíduos idosos, as conclusões obtidas são seguras.
Phillips e Haskell (1995) comentam o fato de que, até recentemente o treinamento de força para idosos era visto como inefetivo, uma vez que esta diminui com o passar dos anos. Quando estudos com idosos encontravam aumento da força muscular, este era atribuído aos efeitos da aprendizagem do movimento. Os autores consideram que os achados sobre a aparente falta de respostas aos programas de força podem ser explicados mais como uma atitude social negativa dos pesquisadores para com os idosos do que como uma insuficiência de fundamentos teóricos. Há 20 anos, os treinamentos de força para idosos baseavam-se e recomendações de cuidados excessivos e as prescrições de treinamento tendiam, exclusivamente, para trabalhos com carga de baixa intensidade.
Contudo, essa visão dos fatos vem se modificando atualmente, pois verifica-se nos últimos anos um crescente aumento de pesquisas muito bem controladas, que vêm mostrando, convincentemente, que o treinamento de força muscular de alta intensidade pode produzir um aumento significativo da força muscular, bem como hipertrofia muscular, de um modo seguro, seja em idosos que vivem na comunidade, seja em idosos institucionalizados e com idade cronológica bastante avançada.
Fiatarone et al. (1990) corroboram essas afirmações. Esses autores, considerando que o treinamento de força é seguro e eficaz em idosos saudáveis, procederam a um estudo com idosos institucionalizados (os quais são poucos estudados sob este aspecto). Desse modo, submeteram dez indivíduos com mais de 90 anos a um treinamento de força de alta intensidade e puderam observar um aumento da força dos membros inferiores de 174% em média, demonstrando uma relação linear entre força do quadríceps e velocidade do andar em indivíduos nonagenários.
Também Binder (1995), preocupada com a qualidade de vida de idosos institucionalizados e demenciados, buscou verificar os efeitos de um trabalho de força com essa população. Num estudo piloto, submeteu um grupo de 25 idosos (idade média de 88,7 anos) a um treinamento semanal de força dos membros inferiores com essa população. Embora seu estudo apresente alguns problemas de ordem metodológicas, a autora recomenda que esse tipo de trabalho faça parte da rotina semanal dessas pessoas, visto que o risco de queda pode ser diminuído com os ganhos de força.
A artrite à instabilidade da maioria das articulações, tais como a dos joelhos, exacerbando outras causas de quedas nesse grupo etário. A força dos músculos responsáveis por essa articulação é a chave para compensação da sua instabilidade. Também tem semelhante importância a velocidade de contração muscular, fundamental em situações de restauração do equilíbrio quando, por exemplo, ocorre algum tropeção (Aoyagi e Shephard 1992).
Cama et al. (1994) observaram em seu estudo que mulheres e homens com idade entre 63 e 79 anos aumentaram sua força (extensores e flexores do joelho). Inicialmente, homens e mulheres mostraram força similar, mas, ao final do treinamento, os homens melhoraram mais. Morini et al. (1994) constataram em seus estudos com idosos de ambos os sexos um aumento significativo na força dos músculos extensores e flexores do joelho, após um treinamento isocinético.
Em relação à dependência final, Work (1989), Aoyagi e Shephard (1992) e Schroll (1994) indicam que a insuficiência de força muscular pode tornar árduas ou impossíveis tarefas como levantar o próprio corpo de uma cadeira, sentar-se sobre vaso sanitário, sair da cama, carregar compras e até mesmo destampar uma garrafa. As pessoas que se confrontam a tais situações passam a ser dependentes de outras, perdem sua autonomia e sua qualidade de vida.
Esses estudos indicam que, se o treinamento da força muscular em indivíduos idosos leva a incrementos dessas capacidades, os aspectos funcionais relativos à marcha, ao equilíbrio (quedas) e a outras ações motoras que dependem da locomoção serão altamente beneficiados por esse tipo de treinamento. Portanto, esse treinamento tem um importante papel na prevenção e reversão de tais mudanças, uma vez que resulta em efeitos positivos para aquisição da força, mesmo numa população mais idosa. Se tal capacidade física deteriora 5% por década e o treinamento a aumenta em 10%, então pode-se retardar em aproximadamente 20 anos a idade na qual a força pode torna-se insuficiente para a realização das tarefas diárias (Buskirk e Segall 1989).
Além da força muscular, Meusel (1984) destaca a flexibilidade como um dos mais importante fatores de segurança, pois ela auxilia na prevenção de acidentes. A flexibilidade, definida como a capacidade de movimento da articulação com a maior amplitude possível, declina de 20% a 30% dos 20 aos 70 anos, com um aumento nesse percentual depois dos 80 anos. A falta de flexibilidade, particularmente nas articulações da coluna, do quadril e dos joelhos, está associada a dificuldade na realização de vários componentes das AVDs e AIVDs, podendo ser a principal causa de desconforto e incapacidade no idoso.
Segundo Phillips e Haskell (1995), a flexibilidade pode mais ser relacionada à “aptidão do tecido” do que ser considerada um componente da aptidão muscular, particularmente no idoso. Isso por que umas das principais limitações na amplitude do movimento articular com a idade resulta do aumento da proporção do tecido conectivo na massa muscular, da desidratação da articulação e da mudança de sua composição em colágeno e elastina. Este conjunto de alterações leva ao aumento da densidade e da rigidez da articulação, levando à diminuição da amplitude de movimento.
A flexibilidade tem sido muito menos estudada do que a força muscular, porém os estudos feitos a esse respeito encontraram efeitos positivos do treinamento na amplitude de movimento do idoso, seja através de programas específicos de alongamento, seja através de outros tipos de programas. É importante ressaltar que são observados efeitos positivos mesmo em pessoas muito idosas.

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